Qualificação da formação docente e seus percalços

Postado por inovar 05/05/2021 0 Comentários

 

Qualificação da formação docente e seus percalços

 

 

 

 

O texto a seguir procura abranger a realidade que permeia a formação de professores, o que tem gerado muitas discussões, análises e considerações por parte de especialistas. Estamos sempre em busca de caminhos que indiquem a melhor forma de aprender e ensinar ao mesmo tempo. Porém encontramos, na maioria das vezes, realidades que não condizem com aquilo que foi idealizado para o trabalho do professor, realidades estas que vão muito além da sua formação.

 


Neste contexto, compartilhamos um link (https://www.youtube.com/watch?v=683X8zaEehc
de uma entrevista feita pela TPA Online/Luanda/Angola com o Professor e Investigador Filipe Zau, o qual mostra a realidade da educação em Angola. Filipe Zau é um investigador em ciências da educação, professor, autor e compositor angolano. Em seguida abordamos reflexões de especialistas sobre o assunto aqui proposto, comparado a outras realidades.

 

 

Analogia entre a actuação de um professor e um médico

 


Você encontra similaridade entre a actuação de um professor e um médico? Acha que a formação desses profissionais pode, em alguma medida, dialogar? O reitor da Universidade de Lisboa, doutor em educação pela Universidade de Genebra, António Nóvoa partiu da análise da proposta formativa da Harvard Medical School para trazer reflexões sobre a formação docente no Brasil, mas que podemos estender a outros países em situação semelhante a qual será relatada aqui.

 


Em encontro realizado no Instituto Singularidades, em parceria com o Instituto Ayrton Senna, em São Paulo/Brasil, o especialista foi taxativo ao dizer que “formar um professor é formar um profissional da educação, assim como formar um médico”, fazendo menção à necessidade da actuação docente ser vista como uma profissão e, portanto, receber toda a importância de qualidade, recursos e investimentos.

 


Estudo de caso e reflexões

 


Nos últimos meses, Nóvoa se dedicou a estudar o programa de formação da universidade norte-americana e resgatou alguns pontos que, segundo ele, tornam o processo formativo mais significativo. Como primeiro ponto, o pesquisador apontou a cerimônia simbólica que marca a entrada dos recém-formados na universidade. Estudantes, professores e médicos já actuantes entregam o jaleco aos egressos, “o que significa que toda a comunidade se responsabiliza pela formação dos futuros médicos”, ressaltou.

 


Outra questão, é o facto da universidade defender uma experiência individualizada como estratégia de formação, entendendo que cada sujeito tem um percurso próprio de aprendizagem a ser seguido. A condução formativa ainda se dá de maneira entrelaçada, se afastando de uma proposta estratificada de currículo. “Ele (o currículo) se apresenta integrado e integrador, aproximando a teoria e a prática em todos os momentos”, reconheceu.

 


Nóvoa também falou das matérias que acabam sendo desenvolvidas a partir de instrumentos, como explicou. “O tempo na universidade é utilizado para o estudo de casos e problemas, e não para as disciplinas, contribuindo para que haja uma visão integrada das questões que cercam a Medicina”. Isso se ancora em um ambiente colaborativo, em que se reconhecem um esforço de socialização, além de dinâmicas de inter-cooperação.

 


Por fim, o pesquisador citou o compromisso com a pesquisa e a acção, como forma de valorizar e sistematizar o conhecimento que é construído dentro da profissão, a partir de seus problemas reais. E também a ligação com o exterior, propondo diálogo permanente com a comunidade.

 

 

                                                                   

 

Para Nóvoa, a agenda da formação docente incorre em um erro central. Ele coloca que muito se diz sobre o que os professores têm que ter ou fazer, de maneira geral, e pouco ou nada se diz sobre como cada professor pode se encontrar individualmente na profissão.

 


“Como que eu me formo como profissional, encontrando a minha própria maneira de ser professor, em conjunto com outros profissionais, pesquisando e agindo no campo institucional da escola, sem nunca exercer o exercício público da minha profissão?”, provocou.

 


A partir disso, o especialista elenca cinco pontos que, a seu ver, podem qualificar as práticas formativas iniciais e continuadas e consequentemente o percurso desses profissionais.

 


1. Disposição pessoal
Nóvoa defende que as formações docentes garantam espaços e tempos para um trabalho de autoconhecimento, de autorreflexão, de maneira que os professores partam de suas histórias pessoais, de vida, de sua subjetividade para então formatar a sua identidade profissional.

 


2. Composição pedagógica
Também entende a importância de que haja processos de composição pedagógica, que permitam aos professores fazerem diferentes elaborações e encontrarem seus próprios modos docentes, com autonomia e conhecimento profissional.

 


3. Interposição profissional
O trabalho, a seu ver, deve partir da socialização e da colaboração entre os pares, esforço que, em sua análise, deve estar presente desde o primeiro dia da formação. Nóvoa ainda defende que os percursos se deem em comunidades práticas de aprendizagem.

 


4. Proposição institucional
Reforça a necessidade dos docentes conquistarem seu espaço na escola, firmando a sua posição profissional e participando do projecto educativo da instituição, a partir de uma postura activa, criadora e transformadora.

 


5. Exposição pública 
Por fim, reconhece a importância de que os professores actuem em outros espaços além da escola, como na comunidade, e também nos espaços públicos da educação. “Hoje vejo fragilidade na presença dos professores nos espaços das políticas públicas educacionais, e é imprescindível que esse lugar seja ocupado”, finalizou.

 


Aprender a ensinar

 


Bernadete Gatti, presidente do Conselho Estadual de Educação de São Paulo/Brasil (CEE-SP), atenta para o facto de que o docente deve aprender a criar ambientes de aprendizagem para os alunos se desenvolverem. Não é isso, contudo, que a formação de professores tem exercido.

 


Em suas pesquisas, Bernadete relata que é comum se deparar com professores bem formados nos conteúdos específicos de sua área, mas que não sabem ensinar. “Nos cursos de licenciatura o aluno não estuda Sociologia ou Antropologia cultural para entender a juventude. Não estuda fundamentos da Educação e vai ser um educador. As universidades precisam dar formação em metodologia e mostrar as várias possibilidades didáticas”, explica a especialista.

 


Assim, quando em sala de aula esse professor encontrar dificuldades, ele saberá buscar outros meios de ensinar. Essa capacidade de encontrar soluções, ser criativo e estar em constante aprendizagem é, inclusive, desejável não somente para os professores em formação, mas para os alunos.

 


Diálogo com os sujeitos e território

 


Lúcia Helena Alvarez Leite, docente e integrante do grupo Territórios, Educação Integral e Cidadania (TEIA) da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais/Brasil (FAE/UFMG), avalia que o primeiro passo para a formação de professores se tornar mais significativa é aproximar os docentes das escolas em geral para conhecerem a realidade ali existente.

 


É nesse contacto com as escolas que os educadores em formação poderão compreender as diversas realidades que convivem em uma mesma sala de aula. Além disso, é no chão de escola que terão consciência da importância que as tecnologias digitais têm para os jovens, por exemplo, e das dificuldades próprias desse ambiente.

 


“Da mesma maneira que a escola tem que se abrir para o bairro, a universidade tem que se abrir para as realidades do País, para conhecer quem são os nossos alunos”, diz Lúcia Alvarez, apontando ainda para a necessidade dos professores lerem o mundo criticamente, entendendo as visões de mundo que os alunos têm a partir de seus contextos de vida.

 


“A educação para uma criança indígena não é a mesma para outra que vive em ambiente urbano ou na periferia. E assim como a presença, a ausência desses sujeitos na escola também precisa ser pensada”, afirma. Por isso, a especialista defende que a formação de professores seja feita por meio da experiência, de oficinas, saídas e trocas com as escolas, e conversas com os egressos.
Formação inicial 

 


Encarar a realidade educacional também significa olhar para o expressivo número de professores sem formação adequada, ainda que leis prevejam que todos os docentes tenham formação específica na área em que actuam.

 


 “Um professor precisa conhecer o currículo da Educação Básica, ter formação cultural, e saber criar ambientes de aprendizagem, porque ele é a base de tudo. A ausência de formação inicial, ou quando ela é feita de forma precária, faz com que a formação continuada seja um supletivo, gastando duplamente o esforço da educação”, diz Bernadete, afirmando que é preciso uma acção incisiva do Governo Federal no sentido de reverter o quadro.

 


Não podemos responsabilizar unicamente o professor pelo desempenho dos alunos, e desconsidera a falta de investimento, as condições precárias de trabalho e a baixa remuneração dos educadores.

 


Condições de trabalho

 


A formação de professores não é a única responsável pela qualidade da educação. As condições de trabalho também interferem directamente. Comumente, milhares de professores entram em depressão ou sofrem de doenças ligadas ao estresse. Em suma, a deficiência do professor existe, porém é preciso verificar o que provoca as limitações profissionais dos mesmos.

 


“Há um forte discurso de valorização da educação, em que não se valoriza o professor”, explica Lúcia Alvarez, citando as formas de contratação dos docentes como exemplo, que por vezes têm contratos temporários e jornadas incompletas.

 


“Muitos professores chegam a três turnos de trabalho para sustentar a família. Como pensar em formação continuada? Há um discurso de que professor não inova, mas muitas vezes são as condições de trabalho que não permitem concretizar essas ideias”, diz Lúcia Alvarez.

 


“O professor que está na rede é um herói, tamanho os obstáculos que ele tem que superar. E eles querem demais ser professor. Então vamos de encontro ao desejo dele, dar uma boa formação docente e as condições de trabalho”, defende Bernadete.

 


“Estamos sendo convidados a mudar o nosso próprio caminho. E a escola tem que acompanhar, porque ela é um elemento estratégico na construção e manutenção de uma cultura”, finaliza Cláudia.

 

 

 

Fontes:

 

1 - https://www.youtube.com/watch?v=683X8zaEehc


2 - https://educacaointegral.org.br/reportagens/veja-cinco-pontos-para-qualificar-formacao-docente-segundo-antonio-novoa/


3- https://educacaointegral.org.br/reportagens/formacao-de-professores-para-o-contexto-da-escola brasileira/#:~:text=Dos%20quase%202%2C2%20milh%C3%B5es,mas%20sem%20cursos%20de%20Licenciatura. 

 


Texto adaptado por: Porª Eliane Ap. Zulian Delázari